OLIVER! (1968)
Partindo
de um espectáculo teatral com excelente argumento, poemas e partitura musical
de Lionel Bart, Carol Reed volta ao romance de Charles Dickens, mas agora em
versão musical. Obviamente que a estrutura de um musical impõe características
muito próprias, mas o talento de Carol Reed e da sua equipa conseguiu o milagre
de se manter fiel ao espírito da obra e do autor, estruturando-a de forma a
respeitar as regras do musical.
A obra
teatral estreou-se nos palcos de Londres em 1960, manteve-se durante uma longa
temporada, e lançou-se na Broadway três anos depois, com igual sucesso. Seria
reposto no West End por duas vezes, em 1994-1998 e novamente entre 2008-2011. A
peça, que alguma crítica da época considerou mais próxima do filme de David
Lean do que do romance de Dickens, resume consideravelmente a intriga da obra
literária, e aligeira-a nalguns aspectos. Sobretudo nos considerados mais
sensíveis. A adaptação para argumento cinematográfico, devida a Vernon Harris,
é bastante boa. A figura de Fagin, um judeu, tinha causado alguns dissabores a
Dickens, que chegou a ser chamado de anti-semita. O próprio Dickens terá
tentado limpar essa imagem em trabalhos futuros, mas Lionel Bart, um judeu
igualmente, resolveu amenizar a personagem de Fagin, carregando mais o seu lado
bonacheirão e cómico e diluindo as asperezas da sua vilania. No filme, estes
aspectos mantêm-se, mas na globalidade a obra permanece muito próxima do
espírito humanista e da crítica social do escritor.
De
resto, conta com um brilhante elenco, Ron Moody, em Fagin, Oliver Reed, em Bill
Sykes, Shani Wallis em Nancy, Hugh Griffith, Harry Secombe, Jack Wild e o
pequeno Mark Lester, no protagonista. Deve referir-se ainda a reconstituição
algo estilizada da Londres vitoriana, que se fica a dever a John Box, a
coreografia dos números musicais, movimentando multidões de bailarinos e
figurantes, invulgarmente coreografados e extremamente inventivos, da
responsabilidade de Onna White, e a belíssima fotografia de um mestre, Oswald
Morris. Deve dizer-se que toda a movimentação coreográfica e brilhante, o que
se pode comprovar desde logo, no inicio, quando Oliver nos é apresentado no
Asilo, numa concepção gráfica e arquitectónica que relembra o “Metropolis”, de
Fritz Lang, ou nesse empolgante número de rua "Consider Yourself".
Carol
Reed, que já nos tinha dado obras admiráveis, como o inesquecível “O Terceiro Homem”,
volta a impressionar pela encenação envolvente deste drama de uma criança que
toca a sensibilidade de todos os públicos, desde os mais jovens aos adultos
mais obstinados. O retrato das personagens é esboçado de forma larga, mas
consistente, e a sua inserção nos ambientes arquitectónicos e humanos é hábil e
decisiva para o triunfo do filme, que se confirma como um dos grandes momentos
do género, numa altura em que o musical começava já a dar mostras de estar
longe da sua época de ouro.
Há
vários números musicais excelentes. A sua ordem,
depois da “Abertura” e do “Tema Central”, é a seguinte: "Food, Glorious
Food"/"Oliver!", "Boy for Sale", "Where is
Love?", "Consider Yourself", "Pick a Pocket or Two",
"It's a Fine Life", "I'd Do Anything", "Be Back Soon",
"Who Will Buy?", "As Long As He Needs Me", "Reviewing
the Situation", "Oom-Pah-Pah", "Reviewing the
Situation", “Final” (recuperando "Where is Love?" e
"Consider Yourself"). Na cerimónia da atribuição dos Oscars
de 1969, “Oliver!”, que tinha sido nomeado para onze estatuetas, acabaria por
arrecadar seis, Melhor Filme, para o produtor John Woolf, Melhor Realização,
para Carol Reed, Melhor Adaptação de partitura Musical, para John Green, Melhor
Direcção Artística e Cenários, para John Box e Terence Marsh, Melhor Som, para
a equipa Buster Ambler, John Cox, Jim Groom, Bob Jones e Tony Dawe, e ainda o
Oscar Honorário da Academia, para Onna White, pelo seu “brilhante contributo
para a arte da coreografia”. As restantes nomeações, não premiadas, foram para
Melhor Actor, Ron Moody, Melhor Actor Secundário, Jack Wild, Melhor Argumento
Adaptado, Vernon Harris, Melhor Fotografia, Oswald Morris, Melhor Guarda-roupa,
Phyllis Dalton, e Melhor Montagem, Ralph Kemplen. Só 34 anos depois um outro
musical, “Chicago”, voltaria a ganhar o Oscar de Melhor Filme do Ano.
Nos
Globos de Ouro do mesmo ano, “Oliver!” voltaria a ganhar o Melhor Filme do Ano,
na categoria de Comédia e Musical, e Ron Moody ganharia o de Melhor Actor, na
mesma categoria. Carol Reed, Hugh Griffith e Jack Wild seriam igualmente
nomeados. Nos BAFTAS de 1969 (os Oscars ingleses), o filme de Carol Reed
contaria oito nomeações, mas perderia todas, muitas delas para “A Primeira
Noite”, de Mike Nichols.
OLIVER!
Título original: Oliver!
Realização: Carol Reed (Inglaterra, 1968); Argumento: Vernon Harris,
segundo versão teatral de Lionel Bart, adaptando obra de Charles Dickens ("Oliver Twist");
Produção: John Woolf; Música: Johnny Green; Fotografia (cor): Oswald Morris;
Montagem: Ralph Kemplen; Casting: Jenia Reissar; Design de produção: John Box;
Direcção artística: Terence Marsh; Guarda-roupa: Phyllis Dalton; Maquilhagem: George Frost,
Bobbie Smith, Hugh Richards; Direcção de Produção: Denis Johnson Jr., Denis Johnson; Assistentes
de realização: Colin M. Brewer, Ray Corbett, Mike Higgins, Chris Kenny;
Departamento de arte: Vernon Dixon, Peter Dukelow, Percy Godbold, Ken
Muggleston; Som: Buster Ambler, John Cox, Jim Groom, Bob Jones; Efeitos
especiais: Alan Bryce; Companhias de produção: Romulus Films, Warwick Film
Productions; Intérpretes: Ron Moody
(Fagin), Mark Lester (Oliver) (dobrado nas canções por Kathe Green), Shani
Wallis (Nancy), Oliver Reed (Bill Sikes), Jack Wild (Artimanhas), Harry Secombe
(Mr. Bumble), Peggy Mount (Mrs. Bumble), Leonard Rossiter (Mr. Sowerberry),
Hylda Baker (Mrs. Sowerberry), Joseph O'Conor (Mr. Brownlow), Sheila White
(Bet), Megs Jenkins (Mrs. Bedwin), Hugh Griffith (Juiz), Kenneth Cranham (Noah
Claypole), Wensley Pithey (Dr. Grimwigg), James Hayter, Elizabeth Knight, Fred
Emney, Edwin Finn, Roy Evans, Norman Mitchell, Robert Bartlett, Graham
Buttrose, Jeffrey Chandler, Kirk Clugston, Dempsey Cook, Christopher Duff,
Nigel Grice, Ronnie Johnson, Nigel
Kingsley, Robert Langley, Brian Lloyd, Peter Lock, Clive Moss, Ian Ramsey,
Peter Renn, Billy Smith, Kim Smith, Freddie Stead, Raymond Ward, John Watters,
etc. Duração: 153 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia Warner Filmes
(DVD); Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal:11 de
Dezembro de 1968.
RON MOODY (1924 - )
Ron
Moody nasceu em Tottenham, a norte de Londres, Inglaterra, a 8 de Janeiro de
1924. Filho de Kate Ogus e Bernard Moodnick, este oriundo de uma família de
judeus russos que emigraram para Inglaterra depois da Revolução Soviética. Primo
de Laurence Moody, que viria a ser realizador televisivo, e da actriz Clare
Lawrence. Frequentou a London School of Economics, com a ideia de se tornar
contabilista, mas haveria de enveredar pelo espectáculo, como actor, de teatro,
cinema e televisão. A sua composição mais célebre foi Fagin, em “Oliver!”,
primeiro no teatro, depois no filme de Carol Reed, com o qual ganharia o Globo
de Ouro de Melhor Actor e seria nomeado para o Oscar na mesma categoria. Na
televisão integrou o elenco de diversas séries, algumas infantis, como “The
Animals of Farthing Wood”, “Noah's Island”, “Telebugs”, “Into the Labyrinth” e
“Discworld”. Actor muito versátil, apareceu em mais de oitenta títulos, a maior
parte dos quais televisivos.
Filmografia
Como actor (títulos mais importantes): 1961: Five Golden Hours (O
Cangalheiro e as Viúvas), de Mario Zampi; 1962: A Pair of Briefs, de Ralph
Thomas; 1963: Mouse on the Moon (Um Rato em Órbita), de Richard Lester; 1963: Summer Holiday (Mocidade em Férias), de
Peter Yates; 1964: Murder Most Foul (A Velha Investiga), de George Pollock;
1965: Every Day's a Holiday (Férias para Todos ), de James Hill; 1966: The
Sandwich Man (Londres é de Gritos), de Robert Hartford-Davis; 1968: Oliver!
(Oliver!), de Carol Reed; 1970: Balbúrdia no Leste (The Twelve Chairs), de Mel
Brooks; 1975: Dogpound Shuffle, de
Jeffrey Bloom; Legend of the Werewolf (A Lenda do Lobisomem), de Freddie
Francis; 1979: The Spaceman and King Arthur
(Um Astronauta na Corte do Rei Artur), de Russ Mayberry; 1982: Wrong Is Right
(O Homem das Lentes Mortais), de Richard Brooks; 1984: Where Is Parsifal? (onde
está o Parsifal?), de Henri Helman; 1995: A Kid in King Arthur's Court (Uma
Viagem à Corte do Rei Artur), de Michael Gottlieb.
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