OS QUATRO CABELEIRAS
DO
APÓS-CALIPSO (1964)
A Hard Day's Night é o primeiro grande sucesso de Richard
Lester a solo na longa metragem. Nascido americano, mas desde cedo a viver em
Londres, o cineasta torna-se conhecido e admirado pela sua colaboração na
curta-metragem de humor aldo surrealizante, “The Running Jumping & Standing
Still Film” (Humor Abstracto, na sua tradução portuguesa), realizada com a
colaboração de Spike Milligan e Peter Sellers. Sellers ficaria seu fã, assim
como os Beatles, então em ascensão meteórica, vindos de Liverpool para o mundo.
Quando a banda é convidada para aparecer num filme, os quatro Beatles, mas em
especial John Lennon, logo escolheram Richard Lester de uma lista de possíveis
realizadores. “A Hard Day's Night” é um sucesso imenso, um dos filmes que
introduz o pop no universo cinematográfico, e Richard Lester passa a ser
considerado, por exemplo pela MTV, como "pai do Video Clip”. No "Village Voice", o importante crítico
Andrew Sarris, descreveu "A Hard Day's Night" como "the “Citizen Kane” of juke box
musicals”. Este
não é o único trabalho do cineasta com a banda de Liverpool, dado que, logo no
ano seguinte, para aproveitar a embalagem, surge “Help!”. A qualidade do cinema
de Richard Lester, e a sua originalidade, não se fica por aqui. Já
anteriormente nos dera
“The Mouse on the Moon” (Um Rato em Órbita, 1962) e “The
Knack... and How to Get It” (Lições de Sedução, 1964), que ganhou a Palma de
Ouro em Cannes, e posteriormente continuaria a oferecer-nos belos exemplos do
seu talento, como esse magnífico “A
Funny Thing Happened on the Way to the Forum” (Em Roma... era Assim, 1966), ou
o belíssimo Petulia (Petúlia, 1968) ou
as interessantes versões de “Robin and Marian” (1976) ou de “The Three
Musketeers” (1973 e seguintes sequelas, menos inspiradas).
“Os Quatro Cabeleiras do Após-Calipso” é um objecto invulgar
sobretudo se reportado ao ano em que foi concebido. Nada antes se fizera assim.
Uma longa-metragem que acompanha um dia de trabalho (e prazer) de uma banda
pop-rock. Esta associação entre o trabalho e o prazer não deixa de ser sintomática.
“Os Beatles” criaram-na na música pop-rock. Este filme é a celebração dessa
ideia. Viver pode ser uma festa, a música é um prazer, e ambas podem ser uma
provocação ao conformismo e à inércia. A personagem do Tio (Wilfred Brambell)
que aparece ligado à banda é um complemento dessa provocação juvenil, que ali
se expressa numa outra condição social e nível etário.
Verdade que visto 50 anos depois esta provocação parece
pueril. Mas na época foi fortíssima, arrastando milhões de fãs, libertando a
sociedade de certas amarras preconceituosas, e criando anticorpos poderosos,
que no entanto foram arrastados na enxurrada do sucesso vertiginoso desta banda
de Liverpool que, de um momento para o outro, conseguiu levar à histeria
milhões de adolescentes enfeitiçadas pelo seu charme, glamour, irreverência e
talento.
O que vemos, portanto, é uma viagem de comboio de Liverpool
em direcção a Londres, onde vão realizar um concerto, ao vivo e com gravação
para TV, assistindo às peripécias do percurso, ao assedio das fãs junto ao
teatro, aos ensaios falhados, às constantes fugas ao programa previsto para os
protagonistas desta viagem, tudo isto realizado com uma total liberdade de
registo, com uma câmara solta, que se marimba para as regras e os conceitos
rígidos, que improvisa, que acompanha a aparente loucura dos quatro de
Liverpool. A viagem permite ainda aproximarmo-nos dos Beatles, descortinando um
pouco da personalidade de cada um deles, oferecendo ainda um conjunto de gags
de seguro efeito cómico. A acrescentar a
tudo isto, um conjunto de canções mais ou menos inesquecíveis, que seriam
lançadas em álbum: "A Hard Day's Night", "I Should Have Known
Better", "Can't Buy Me Love", "If I Fell", "And I
Love Her", "I'm Happy Just to Dance With You", "Tell Me
Why", "Don't Bother Me", "I Wanna Be Your Man",
"All My Loving" ou "She Loves You".
No apogeu na beatlemania este é um must que documenta uma
época, o trabalho de uma banda que marcaria para sempre o panorama musical
internacional e um momento inovador e inspirador da cinematografia inglesa.
OS QUATRO CABELEIRAS DO
APÓS-CALIPSO
Título original: A Hard Day's Night
Realização:
Richard Lester (Inglaterra, 1964); Argumento: Alun Owen; Produção: Denis
O'Dell, Walter Shenson, David V. Picker;
Música: Beatles; Fotografia (p/b):
Gilbert Taylor; Montagem: John Jympson; Direcção artística: Ray Simm;
Guarda-roupa: Julie Harris, Dougie Millings; Maquilhagem: Betty Glasow, John
O'Gorman; Direcção de Produção: John
Rogers; Assistentes de realização: John D. Merriman, Alex Carver-Hill, Bob
Howard, Barrie Melrose; Departamento de arte: William Alexander; Som: Michael
Barry, H.L. Bird, Stephen Dalby, Gordon Daniel, Michael DiCosimo, Kevin Reeves;
Efeitos visuais: Ronnie Wass; Companhias de produção: Proscenium Films, Walter
Shenson Films, Maljack Productions; Intérpretes:
The Beatles (Beatles), John Lennon (John), Paul McCartney (Paul),George Harrison (George), Ringo Starr
(Ringo), Wilfrid Brambell (Avô), Norman Rossington (Norm), John Junkin (Shake),
Victor Spinetti (Realizador de TV), Anna Quayle (Millie), Deryck Guyler (Inspector de polícia), Richard Vernon,
Edward Malin, Robin Ray, Lionel Blair, Alison Seebohm, David Janson, Bridget
Armstrong, Roger Avon, Bruce Beeby, John Bluthal, Pattie Boyd, Andrea Brett,
Terry Brooks, Prudence Bury, Pauline Chamberlain, Anne Clune, Phil Collins (um
fã), Rosemarie Frankland, Bob Godfrey (homem no parque), Kenneth Haigh, Susan
Hampshire ( mulher dançando disco), Julian Holloway, Terry Hooper, Ric Hutton, Clare Kelly,
Lavinia Lang, David Langton, Richard Lester (homem no fundo do palco), Linda Lewis, Jeremy Lloyd, Maggie London,
Jane Lumb, Dougie Millings, Peter Newton, Derek Nimmo, Margaret Nolan, Gordon
Rollings, Edina Ronay, Sally Sheridan, Geraldine Sherman, Marianne Stone,
Michael Trubshawe, Hedger Wallace, Shalini Waran, Carol White, Susan Whitman,
Tina Williams, etc. Duração: 87 minutos; Distribuição em
Portugal (DVD): LNK; Classificação etária: M/ 6 anos.
RICHARD LESTER (1932-)
Richard
Lester nasceu a 19 de Janeiro de 1932, em Filadélfia (EUA), mas fez quase toda
a sua carreira cinematográfica em Inglaterra. Menino-prodígio, entrou para a
Universidade da Pensilvânia com quinze anos e começou a trabalhar na televisão
em 1950, primeiro como contra-regra, depois assistente de realização e
rapidamente passou a realizador. Em 1953, Richard Lester muda-se para Londres e
começa a trabalhar como free-lancer para os produtores “The Danziger Brothers”,
na série “Mark Saber”. Peter Sellers contrata-o para ajudar na adaptação da
comédia radiofónica da BBC (The Goon Show) para televisão, “The Idiot Weekly,
Price 2d”, que foi um sucesso, seguido dos shows “A Show Called Fred” e “Son of
Fred”. A curta-metragem “The Running Jumping & Standing Still Film” (Humor
Abstracto, na sua tradução portuguesa), realizada por Richard Lester, com a
colaboração de Spike Milligan e Peter Sellers era o dos filmes favoritos dos
Beatles, especialmente de John Lennon, e quando
a banda de Liverpool foi contratada, em 1964, para fazer um filme,
escolheu Richard Lester de uma lista de possíveis realizadores. “A Hard Day's
Night” resulta num sucesso imenso, um dos filmes que introduz o pop no universo
cinematográfico, e Richard Lester passa a ser considerado, por exemplo pela
MTV, como "pai do Video Clip”. No
"Village Voice", o importante critico Andrew Sarris, descreveu
"A Hard Day's Night" como
"the “Citizen Kane” of juke box musicals”. Lester dirigiu um novo filme
com os Beatles, “Help!”, em 1965, e várias outras obras particularmente
sugestivas, quer temática, quer estilisticamente. A comédia “The
Knack…And How to Get It” (1965), que ganhou a Palma de Ouro no Festival de
Cannes, o belíssimo “Petúlia” (1965), o burlesco “A Funny Thing Happened on the
Way to the Forum” (1966), que relança Buster Keaton, ou a sátira “How I Won the
War”, com John Lennon. Nos
anos 1970, Lester dirigiu uma interessante evocação de Robin dos Bosques
envelhecido, “Robin and Marian” (1976), com Sean Connery e Audrey Hepburn, e
uma nova versão de “The Three Musketeers” (1973) e duas outras sequelas. Na
última, em 1988, “The Return of the Musketeers”, durante as filmagens na
Espanha, o actor Roy Kinnear, um amigo próximo, morreu ao cair de um cavalo.
Lester concluiu o filme e abandonou o cinema, com esporádicas incursões a
pedido dos amigos. Em 1993, ele apresentou na BBC, “Hollywood UK”, uma série de
televisão, em cinco episódios, sobre o cinema britânico dos anos 60. Nos
últimos anos, algo esquecido e subvalorizado, recentemente vê-se reavaliado por
um cineasta como Steven Soderbergh, que escreveu sobre Lester a obra “Getting Away With It”.
Filmografia:
Como realizador: 1954:
The Vise (TV); 1956: Son of Fred (TV) (2 episódios); A Show Called Fred (TV) (5
episódios); The Idiot Weekly, Price 2d (TV); 1958: After Hours (TV); 1960: The
Running Jumping & Standing Still Film (Humor Abstrato)(curta-metragem)
(assinado por Dick Lester); 1962: The Mouse on the Moon (Um Rato em Órbita);
It's Trad, Dad! (assinado por Dick Lester);
1964: The Knack... and How to Get It (Lições de Sedução); A Hard Day's Night
(Os Quatro Cabeleiras do Após-Calipso); Room at the Bottom (TV) (2 episódios);
1965: Help! (Socorro!); 1966: A Funny Thing Happened on the Way to the Forum
(Em Roma... era Assim); 1967: How I Won the War; 1968: Petulia (Petúlia); 1969:
The Bed Sitting Room (O Quarto-sala); 1973: The Three Musketeers (Os Três
Mosqueteiros - Os Diamantes da Rainha); 1974: Juggernaut (Código: Juggernaut);
The Four Musketeers (Os Quatro Mosqueteiros: A Vingança de Milady); 1975: Royal
Flash (O Herói das Arábias); 1976: The Ritz (The Ritz); Robin and Marian (A
Flecha e a Rosa); 1979: Cuba (Cuba); Butch and Sundance: the Early Days (Butch
e o Kid, os Aventureiros); 1980: Superman II (Super-homem II); 1983: Superman
III (Super-homem III); 1984: Finders Keepers; 1989: The Return of the
Musketeers (O Regresso dos Três Mosqueteiros); Paul McCartney (documentário);
1991: Get Back - O Filme! (documentário); 2006: Superman II (Video) (não creditado);
Como actor: 1970: The Persuaders, de Basil
Dearden; 1995: The Beatles Anthology – vídeo;
Como produtor: 1978: Superman - The Movie
(Super-homem, o Filme).
Os
Beatles foram uma das principais, senão a principal, banda de pop-rock inglesa
que teve um impacto internacional enorme. Originários de Liverpool, John
Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr formaram a banda em 1960
e mantiveram-se no top da popularidade durante toda a década. Inicialmente,
lançaram-se no rock, ganhando influência em cantores como Elvis Presley, Carl
Perkins, Little Richard, Chuck Berry e outros, mas ao longo da carreira
passaram pela balada, pelo psicadélico, inclusive pelo hard rock, inovando e
sofisticando temas de sua autoria.
A banda
tem uma pré-história. Em Março de 1957, John Lennon, com 16 anos, forma um
grupo com amigos da Auarry Bank School, os Blackjacks. Mais tarde passaram a
Quarrymen. Junta-se ao grupo, com 15 anos, Paul McCartney que, mais tarde,
convida o seu amigo George Harrison, então com 14 anos, para ouvir a banda.
Este quer entrar, Lennon acha-o muito novo, mas acaba por aceitar, apos um mês
de insistência. Já estão reunidos três mosqueteiros, dos quatro definitivos.
Lennon começa a estudar no Liverpool College of Art. Um colega, Stuart
Sutcliffe, junta-se ao grupo em Janeiro de 1960, e mudam o nome para Beatals, como
tributo a Buddy Holly and the Crickets. Usam a designação até Maio, depois
passam a Silver Beetles. Em Agosto, mudam definitivamente o nome para Beatles,
não sem antes terem sido os Silver Beatles. Viajam por Hamburgo, são por essa
altura cinco elementos, e são notados, de novo em Liverpool, quando já dão
concertos no lendário Cavern Club, por Brian Epstein, um colunista musical e
dono de uma loja de discos, que aponta as potencialidades do grupo. O produtor
George Martin assina um contrato com o grupo para a EMI's Parlophone e dão o
seu primeiro concerto em Londres, a 6 de Junho de 1962, no EMI's Abbey Road
Studios. Como acharam que um dos participantes era fraco, convidaram Ringo
Starr, que actuava nos Rory Storm and the Hurricanes a juntar-se ao grupo. Iniciam-se
as gravações dos discos e o sucesso é quase fulminante. Entre 1963 e 1966,
explode a Beatlemania e iniciam-se os tours. “A Hard Day's Night”, realizado
por Richard Lester, ocupa a banda durante seis semanas. As estreias em Londres
e Nova Iorque resultam em êxitos clamorosos. Em Abril de 1964, 12 temas dos
Beatles ocupam posições cimeiras na lista dos 100 do Billboard Hot 100,
incluindo os cinco primeiros temas.
O grupo
mantém-se unido até 29 de Dezembro de 1974, após o que cada um inicia carreiras
a solo, por vezes com a colaboração de outros elementos da banda. Em Dezembro
de 1980, John Lennon é assassinado. Em 1988, os Beatles inscrevem o seu nome no
Rock and Roll Hall of Fame, na presença de Harrison, Ringo, a viúva de Lennon,
Yoko Ono. McCartney declina o convite.
Discografia original em Inglaterra:
Please Please Me (1963), With the Beatles (1963), A Hard Day's Night (1964),
Beatles for Sale (1964), Help! (1965), Rubber Soul (1965), Revolver (1966),
Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967), The Beatles (White Album) (1968),
Yellow Submarine (1969), Abbey Road (1969) e Let It Be (1970), além de Long
Tall Sally (1964) e Magical Mystery Tour (1967). Mas existem dezenas de compilações e de
uma discogarfia isolada de John Lennon, Paul McCartney , George Harrison e
Ringo Starr.
John Lennon: John Winston Lennon nasceu em
Liverpool, em 9 de Outubro de 1940, mais tarde John Winston Ono Lennon, quando
casou com a artista plástica Yoko Ono em 1969. Foi assassinado em Nova Iorque,
em 8 de Dezembro de 1980, no Central Park.
Paul McCartney: nasceu James Paul McCartney,
em Liverpool, a 18 de Junho de 1942, mais tarde Sir James Paul McCartney,
quando condecorado com o OIB em 1997.
George Harrison: George Harold Harrison nasceu
em Liverpool, a 25 de Fevereiro de 1943 e faleceu, vítima de cancro, em Los
Angeles, a 29 de Novembro de 2001.
Ringo Starr: Richard Starkey nasceu em
Liverpool, 7 de Julho de 1940.
Personalidades que tiveram
importância no sucesso do grupo: Stuart Sutcliffe, pelo seu papel no
início do grupo como baixista; Pete Best, baterista do grupo de 1960 a 1962,
substituído por Ringo Starr; Neil Aspinall, gerente dos Beatles desde a sua
criação até 1963 e, em seguida, seu assistente pessoal; Klaus Voormann,
artista, amigo dos Beatles, designer das capas dos álbuns Revolver e do The
Beatles Anthology; Brian Epstein, descobridor do grupo e, em seguida,
empresário dos Beatles até a sua morte em 1967; George Martin, patrono da
produtora Parlophone, uma divisão da EMI, que contratou os Beatles em 1962.
Jimmy Nicol, baterista que substituiu Ringo Starr quando este ficou doente,
para uma dezena de concertos durante a tournée australiana dos Beatles, em
Junho de 1964; Derek Taylor, assessor de imprensa e confidente dos Beatles;
Billy Preston, teclista que participou da gravação do álbum Let It Be, e também
em algumas faixas de Abbey Road (1969).
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