MOMENTOS
DE GLÓRIA (1980)
“Chariots of Fire” assinalou um magnífico início de carreira
de Hugh Hudson na longa-metragem de ficção. Não basta recordar os quatro Oscars
(Melhor Filme, Melhor Argumento original, Melhor Guarda-roupa. Melhor Partitura
Musical), nem as restantes nomeações (entre elas a de Melhor Realizador), mas
ainda a sua triunfante passagem pelos BAFTAS, Globos, Festival de Cannes, etc. Este
foi obviamente o filme que lançou o cineasta, que depois nos deu ainda algumas
outras obras interessantes, como “Greystoke - The Legend of Tarzan, Lord of the
Apes” (1984) ou “Revolution” (1985).
Mas também é evidente que quando se recompensa
internacionalmente “Chariots of Fire”, quem se recompensa essencialmente é o
seu produtor, David Putman, um inglês que realmente contribuiu imenso para o
prestígio da cinematografia britânica durante as décadas de 70 e 80 do século
XX, contribuindo ainda, e muito, para a aproximação do cinema inglês do
americano. O Oscar “Melhor Filme” bem o indica - é o produtor quem se visa
essencialmente. E a verdade é que este é também, e essencialmente, um filme de
produtor.
Toda a riqueza de David Putman foi posta ao serviço desta
reconstituição histórica de um período determinado da vida da Grã-Bretanha:
entre 1919-1924, vamos acompanhar a luta de dois jovens alunos de Cambridge,
cuja paixão maior é a corrida. Um, Eric Liddell, filho de um missionário na
China, está igualmente possuído por um intenso sentimento religioso, que o
obrigará, inclusive, a desistir de uma prova eliminatória nos Jogos Olímpicos
de Paris (1924), porque esta se realizava num dia que a sua religião consagra
inteiramente ao Senhor. Mas nessas mesmas Olimpíadas conseguirá ser o melhor
nos 400 metros, e conquistar um “record” mundial dificilmente ultrapassável. O
outro, Harold Abrahams, judeu cujos pais vêm da Lituânia, representa um tipo de
desportista em ascensão, mais ligado a uma carreira profissional, treinando-se
cientificamente segundo todos os preceitos da época. Será ele quem triunfará
nos 100 metros, conquistando a única medalha de ouro na distância ganha por um
inglês. Mas Harold tem contra si o facto de ser judeu, um pouco plebeu, de a
sua corrida ser uma forma de se impor contra o preconceito, contra a tradição
universitária, contra os métodos antiquados de treino, contra um certo racismo
que impera e que vê com maus olhos que ele seja treinado por um descendentes de
árabes.
Ambos atingiram um lugar mítico em Inglaterra. O primeiro
iria morrer na China, em 1945, servindo o Senhor como missionário. O segundo
viveria até 1978, entregue à sua devoção desportista. Ambos demonstram até que
ponto pode a Fé mover montanhas, até que ponto pode o espírito domar a carne e
levá-la até “performances” julgadas impossíveis. Tudo ao serviço de Deus, do
Rei e da Pátria. Mas também, e sobretudo parece ser essa a mensagem do filme,
ao serviço de convicções pessoais que não se atraiçoam.
Surpreendente será a reconstituição de época, de um rigor e
precisão inultrapassáveis neste género de filme. Não é tanto uma reconstituição
que tenha a preocupação de recuperar grandes acontecimentos, ainda que estes
surjam, como a abertura dos VIII Jogos Olímpicos de 1924, em França, mas
sobretudo a eficaz e pormenorizada restauração de um tom, de um ar do tempo, de
pequenos elementos do dia-a-dia, e, acima de tudo, a forma magnífica como nos é
restituída a aparente e serena placidez e o fleumático rigor de um certo
formalismo, tal como o snobismo distante e rígido e uma certa soberba inglesas.
Depois há ainda sóbrias e subtis anotações sobre os comportamentos de classes
sociais no interior do tecido social britânico.
A realização evolui como uma corrida, por vezes discreta,
por vezes algo irritante nalguns preciosismos, nem sempre eficazes, muitas
vezes escusados. Os ralentis com a música de Vangelis por fundo tornaram-se num
imagem de marca de competição e empreendorismo, o que de certa forma desvirtua
até as intenções do filme. De qualquer forma, Hugh Hudson surgia na altura como
um cineasta a seguir com atenção, dirigindo com correcção os seus actores
(alguns brilhantes, como é o caso de Ian Holm, que interpreta o papel de
treinador) e dominando a narrativa de forma eficaz. Vangelis é o autor de uma
boa partitura, daquelas que perduram na memória.
MOMENTOS DE GLÓRIA
Título original: Chariots of
Fire
Realização: Hugh Hudson (Inglaterra,
1981); Argumento: Colin Welland; Produção: David Puttnam, James Crawford, Dodi
Fayed, Jake Eberts; Música: Vangelis (ou Vangelis Papathanassiou); Fotografia
(cor): David Watkin; Montagem: Terry Rawlings; Casting: Esta Charkham; Direcção
artística: Jonathan Amberston, Len Huntingford, Anna Ridley, Andrew Sanders;
Guarda-roupa: Milena Canonero; Maquilhagem: Kenteas Brine, Maureen
Hannaford-Naisbitt, Kate Healy, Mary Hillman, Joan Hills, Hilary Steinberg;
Direcção de Produção: Joyce Herlihy; Assistentes de realização: Jonathan
Benson, Matthew Binns, Terence Fitch, Melvin Lind, Hugh O'Donnell, Bill
Rudgard, Jeremy Coote; Departamento de arte: Roy Evans, Roger Hall; Som: Bill
Rowe, Jim Shields, Clive Winter; Efeitos visuais: Ray Caple; Companhias de
produção: Twentieth Century Fox Film Corporation, Allied Stars Ltd., Enigma
Productions; A produção e a realização agradecem a colaboração de
especialistas: Timothy Burrill, Bernard Coote, Tim Hampton, Jennie Liddell,
Sanford Lieberson, Jackson Scholz; Intérpretes:
Nicholas Farrell (Aubrey Montague), Nigel Havers (Lord Andrew Lindsay), Ian
Charleson (Eric Liddell), Ben Cross (Harold Abrahams), Daniel Gerroll (Henry
Stallard), Ian Holm (Sam Mussabini), John Gielgud (Master of Trinity), Lindsay
Anderson (Master of Caius), Nigel Davenport (Lord Birkenhead), Cheryl
Campbell (Jennie Liddell), Alice Krige
(Sybil Gordon), Dennis Christopher (Charles Paddock), Brad Davis (Jackson
Scholz), Patrick Magee (Lord Cadogan), Peter Egan, Struan Rodger, David
Yelland, Yves Beneyton, Jeremy Sinden, Gordon Hammersley, Andrew Hawkins,
Richard Griffiths, John Young, Benny Young, Yvonne Gilan, Jack Smethurst, Gerry
Slevin, Peter Cellier, Stephen Mallatratt, Colin Bruce, Alan Polonsky, Edward
Wiley, Philip O'Brien, Ralph Lawton, John Rutland, Alan Dudley, Tommy Boyle,
Kim Clifford, Wallace Campbell, Patrick Doyle, David John, Tess Dignan, Ruby
Wax, Michael Jeyes, David Kivlin, Eddie Hughson, Gayle Garyson, Rosy Clayton,
Carole Ashby, Sara Roache, Paul Howard, Steve Ambrose, Michael Lonsdale, Peter
Jones, Graham Brooke, Dave Turner, Kenneth Branagh (estudante de Cambridge),
Stephen Fry (cantor na 'H.M.S. Pinafore'), etc. Duração: 124 minutos;
Distribuição em Portugal (DVD): LNK; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de
estreia em Portugal: 25 de Novembro de 1981.
Hugh
Hudson nasceu a 25 de Agosto de 1936, em Londres, Inglaterra. Estudou no Eton
College.
A sua
família tem origem escocesa e do pequeno estado de Cumberland. Fez o serviço
militar no Royal Armoured Corps 81956-1960). Passou em seguida por Paris, onde
inicia a sua actividade no cinema, primeiro como montador. Funda uma companhia
de documentários com Robert Brownjohn e David Camell, que produz, entre outros,
“A for Apple!” e “The Tortoise and the Hare”, primeiros filmes do cineasta, o
último dos quais nomeado para o BAFTA. Foi realizador de segunda equipa de Alan
Parker em “Midnight Express”. “Chariots of Fire” (1981) é o seu primeiro filme
de fundo e ficção e também o seu maior sucesso, ganhando quatro Oscars,
incluindo o de Melhor Filme. A seguir, assina outras obras, de maior ou menor
sucesso, como “Greystoke - The Legend of Tarzan, Lord of the Apes” (1984) ou
“Revolution” (1985). Ganhou diversos prémios e recompensas internacionais.
“Chariots of Fire” logrou quatro Oscars, incluindo o de Melhor Filme, e uma
nomeação para Melhor Realizador. O mesmo filme ganharia igualmente o BAFTA para
Melhor Filme Inglês. Casado com a pintora Susan Caroline Michie (1977) e
posteriormente com a actriz Maryam d'Abo (2003-até ao presente).
Filmografia
Como realizador: 1963: A... is for Apple
(curta-metragem); 1965: Design for Today (curta-metragem documental); 1967: The
Tortoise and the Hare (curta-metragem); 1975: Fangio: Una vita a 300 all'ora;
1978: 12 Squadron Buccaneers (curta-metragem documental); 1981: Chariots of
Fire (Momentos de Glória); 1984: Greystone the legend of Tarzan, Lord of the
Apes (Greystoke - A Lenda de Tarzan o Rei da Selva); 1985: Revolution
(Revolução); 1987: Labour Party Election Broadcast (21 May 1987)
(curta-metragem documental); 1989: Lost Angels ou The Road Home (Rebeldes Sem
Causa); 1995: Lumière et Compagnie ou Lumière and Company (um dos 41
realizadores a dirigirem uma curta integrada nesta homenagem aos 100 anos do
cinema); 1999: My Life So Far; 2000: I Dreamed of Africa (África dos Meus
Sonhos); 2006: Sarah Brightman: Diva - The Video Collection; 2008: Revolution
Revisited; 2011: Rupture - A Matter of Life or Death (documentário).
DAVID PUTTNAM (1941 - )
David
Terence Puttnam, Barão Puttnam, nasceu a 25 de Fevereiro de 1941, em Southgate,
Londres, Inglaterra. Político, representante do Partido Trabalhista do Reino Unido na
Câmara dos Lordes, escritor, actor num filme, é sobretudo referido no meio
cinematográfico como um produtor particularmente importante nas décadas de 70 e
80 do século XX, contribuindo decisivamente para a renovação da cinematografia
britânica. Comendador da Ordem do Império Britânico em 1983, Cavaleiro em 1995,
par do reino com o título de Barão de Puttnam em 1997. Casado com Patricia Mary
Jones (1961 – até ao presente). Trabalhou para várias casas produtoras inglesas
e norte-americanas, antes de criar a sua própria casa, em 1976, a Enigma
Productions, que ergueu obras tão importantes quanto o foram “The Duellists”,
“Chariots of Fire”, “Local Hero”, “Memphis Belle”, “Meeting Venus”, “The
Killing Fields” e “The Mission”. Foi administrador da Columbia Pictures, de
1986 a 1988. Em 1998, retirou-se quase inteiramente da indústria
cinematográfica e dedica-se à educação e ao ambiente.
Filmografia
Como produtor: 1968:
The Wild, Wild World of Jayne Mansfield, de Charles Ross (documentário); 1971:
Peacemaking 1919, de David Mingay; 1971: Melody, de Waris Hussein; 1972:
Glastonbury Fayre (documentário); Bringing It All Back Home (curta-metragem);
The Pied Piper (A Flauta Mágica), de Jacques Demy; 1973: Swastika
(documentário); 1973: The Final Programme, de Robert Fuest; Double Headed
Eagle: Hitler's Rise to Power 1918-1933 (documentário); That'll Be the Day (Um
Certo Verão), de Claude Whatham; 1974: Stardust, de Michael Apted; Mahler
(Mahler, Delírio Fantástico), de Ken Russell; Radio Wonderful (documentário);
1975: James Dean: The First American Teenager, de Ray Connolly. (TV)
(documentário); Brother, Can You Spare a Dime?, de Philippe Mora
(documentário); Lisztomania (Lisztomania), de Ken Russell; 1976: Bugsy Malone
(Bugsy Malone), de Alan Parker; The Memory of Justice, de Marcel Ophüls
(documentário); 1977: The Duellists (O Duelo), de Ridley Scott; 1978: Midnight
Express (O Expresso da Meia-Noite), de Alan Parker; 1980: Foxes (Gatonas), de
Adrian Lyne; 1981: Chariots of Fire (Momentos de Glória), de Hugh Hudson; 1982:
Experience Preferred... But Not Essential (Prefere-se a Experiência mas não é
Essencial ), de Peter Duffell; P'tang,
Yang, Kipperbang, de Michael Apted (TV); 1983: Local Hero (Um Tipo Genial),de
Bill Forsyth; The Frog Prince, de Jackson Hunsicker; Secrets, de Gavin Millar;
Those Glory Glory Days (TV); 1983: Red Monarch (O Monarca Vermelho), de Jack
Gold (TV); 1984: P'tang, Yang, Kipperbang. (TV); Cal (Tempo de Guerra), de Pat
O’Connor; 1984: The Killing Fields (Terra Sangrenta), de Roland Joffé; Winter
Flight, de Roy Battersby; Sharma and Beyond (TV); 1985: Mr. Love, de Roy
Battersby; Defence of the Realm (Em Defesa da Nação), de David Drury; 1986:
Arthur's Hallowed Ground (TV), Forever Young, de David Drury; The Mission (A
Missão), de Roland Joffé; Knights & Emeralds, de Ian Emes; 1990: A
Dangerous Man: Lawrence After Arabia, de Christopher Menaul (TV); Memphis Belle
(A Bela Memphis), de Michael Caton-Jones; 1991: Without Warning: The James
Brady Story (Sem Aviso: A História de James Brady)(TV); Meeting Venus (Tentação
de Vénus), de István Szabó; The Josephine Baker Story (TV); 1992: Great
Performances (TV) (1 episódio: A Dangerous Man: Lawrence After Arabia); 1993:
Being Human (Gente como Nós), de Bill Forsyth; 1994: War of the Buttons, de
John Roberts; 1994: The Burning Season (Amazónia a Ferro e Fogo) (TV); 1995: Le
Confessionnal (O Confessionário), de Robert Lapage; 1999: My Life So Far, de
Hugh Hudson; 2009: We Are the People We've Been Waiting For (documentário);
2014: I am Chut Wutty (documentário) .
Como actor: 1980:
A Pocketful of Dreams, de Stuart Urban (TV).
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