O FIM DA
AVENTURA (1999)
Graham Greene é um escritor afortunado com o cinema. A
grande maioria das suas obras foram adaptadas ao grande ecrã, não se podendo
dizer que sempre com grande qualidade, mas quase sempre com alguma dignidade.
“England Made Me” (1935), “The Confidential Agent” (1939) “The Power and the
Glory” (1940), “The Ministry of Fear” (1943), “The Third Man” (1949), “The End
of the Affair” (1951), “The Quiet American” (1955), “Our Man in Havana” (1958),
“The Comedians (1966), “Travels with My Aunt” (1969), “The Honorary Consul”
(1973) ou “The Human Factor” (1978) conheceram versões interessantes, nalguns
casos deram lugar mesmo a muito bons filmes.
“The End of the Affair” teve mesmo duas versões oficiais.
Uma de 1955, dirigida por Edward Dmytryk, com uma excelente Deborah Kerr, ao
lado de Van Johnson, John Mills e Peter Cushing nos principais papeis, uma
leitura suavizada pela época e pela censura do código Hays. A outra, mais
recente, com um elenco de luxo, com Julianne Moore, de novo numa criação
notável, e ainda Ralph Fiennes, Stephen Rea, James Bolam e Ian Hart, com
argumento e realização de Neil Jordan. São duas versões interessantes, mas
resolutamente mais conseguida a de Neil Jordan, quer pela sensibilidade da
realização, pela qualidade do trabalho interpretativos, quer sobretudo pelo
clima criado em redor desta história que parece ter muito de autobiográfica. Na
verdade, todo o filme se desenrola numa atmosfera brumosa, chuvosa,
pressagiando drama ou tragédia desde inicio. Depois a intriga é daquelas caras
a Graham Greene, uma teia de emoções urdida no interior de um triângulo amoroso
que tem a II Guerra Mundial como pano de fundo.
Tudo se passa em Londres, mas a
narrativa oscila constantemente entre dois tempos, o agora, no final da guerra,
e dois anos antes, quando a parte mais substancial da história aconteceu.
Maurice Bendrix (Ralph Fiennes), escritor, encontra Sarah (Julianne Moore),
casada com Henry Miles (Stephen Rea), e apaixonam-se. O romance explode, tal
como as bombas que caiem sobre a capital inglesa. Durante um bombardeamento,
Sarah julga que Maurice foi ferido mortalmente, e promete a Deus o impossível
caso o seu apaixonado não tivesse morrido. O milagre parece acontecer e a
partir daí toda a história se precipita num turbilhão de equívocos e
desencontros. O ciúme arrasta as personagens para comportamentos cada vez mais
bizarros, e cada uma delas depara-se com opções amargas. O entrecho imaginado
por Graham Greene (que nos dizem ter
sido parcialmente vivido pelo escritor, durante um “affair” Lady Catherine
Walston, uma mulher casada que parece ter servido de modelo à Sarah do romance.
De resto a primeira edição da obra literária surge dedicada a “C”, nas
posteriores a dedicatória torna-se mais explicita, a “Catherine” e, afirma quem
estudou a biografia do escritor, que este viu a sua casa, situado no nº 14 de
Clapham Common Northside, ser bombardeada durante o Blitz, e ele próprio ter
ficado ferido. Muitas coincidências para não ser verdade, sobretudo pelo que de
irreal a história pode conter, demasiado fantasista para não ser autêntica,
ainda que aqui e ali romanceada pela veia literária de Greene.
Quando o romance foi escrito, 1951, Graham Greene era um
escritor crente, profundamente católico. Os estudiosos da sua obra afirmam que
“The End of the Affair” é a sua última criação abertamente católica. Mas a obra
é sobretudo uma envolvente história de amor, apaixonada e febril, com
personagens extremamente complexos cujas razões últimas apenas de suspeitam.
A figura de Henry Miles, por exemplo, atormentado pela
impotência (física ou psicológica?) é excelentemente desenhada por Stephen Rea
( o mesmo que nos dera o deslumbrante trabalho em ”Jogo de Lágrimas”, do mesmo
Neil Jordan). O próprio detective privado, que se faz acompanhar pelo filho
durante as investigações, é uma criação magnifica, tanto no romance como no
filme.
Uma fotografia de um incrível colorido e de perfeita
adequação ao clima desejado e a partitura musical de Michael Nyman ajudam em
muito à realização de Neil Jordan que talvez fosse beneficiada com um maior
rigor na contensão plástica. Mas estamos abertamente no domínio do melodrama e
dos seus excessos assumidos.
Curiosidades adicionais: em 2004, Jake Heggie compôs uma
ópera baseada neste romance, que teve a sua estreia na Houston Grand Opera nos
EUA. Em 2011, foi a vez de Karla Boos escrever uma peça de teatro estreada
igualmente nos EUA, em Pittsburgh, no Quantum Theatre, sobre o tema de “The End
of the Affair”.
O FIM DA AVENTURA
Título original: The End of the
Affair
Realização: Neil Jordan (Inglaterra,
1999); Argumento: Neil Jordan, segundo romance de Graham Greene; Produção: Neil
Jordan, Kathy Sykes, Stephen Woolley; Música: Michael Nyman; Fotografia (cor):
Roger Pratt; Montagem: Tony Lawson; Casting: Susie Figgis; Design de produção:
Anthony Pratt; Direcção artística: Jon Billington, Chris Seagers, Tony
Woollard; Decoração: John Bush; Joanne Woollard; Guarda-roupa: Sandy Powell;
Maquilhagem: Christine Beveridge; Direcção de Produção: Phil Hounam, Michael
Saxton; Assistentes de realização: Patrick Clayton, Sean Clayton, Marios
Hamboulides, Michael Stevenson, Ian Stone, Anthony Wilcox; Departamento de
arte: John Bohan, Danny Rogers, Derek Whorlow; Som: John Lewis Aschenbrenner,
Mark Auguste, David Stephenson; Efeitos especiais: Yves De Bono, Trevor
Neighbour; Efeitos visuais: Martin Body, Libby Hazell, Mark Nelmes; Companhia
de produção: Columbia Pictures Corporation; Intérpretes: Ralph Fiennes (Maurice Bendrix), Stephen Rea (Henry
Miles), Julianne Moore (Sarah Miles), Heather-Jay Jones (empregada de Henry),
James Bolam (Mr. Savage), Ian Hart (Mr. Parkis), Sam Bould (Lance Parkis),
Cyril Shaps, Penny Morrell, Simon Fisher-Turner, Jason Isaacs, Deborah Findlay,
Nicholas Hewetson, Jack McKenzie, Nic Main, etc. Duração: 102 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia Filmes;
Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 18 de Fevereiro
de 2000.
NEIL JORDAN (1950 - )
Neil
Jordan nasceu em Sligo, Irlanda, Reino Unido, a 25 de Fevereiro de 1950. Filho de uma bem instalada família da classe
média irlandesa, o pai era professor
universitário, a mãe pintora. Para lá de realizador, argumentista, actor e
sobretudo realizador, é ainda autor de vários romances de certo sucesso publico
e critico, com histórias sobre a Irlanda. Estudou na St. Paul's School em
Clontarf, Dublin. A sua estreia no cinema dá-se como conselheiro artístico de
John Boorman em “Excalibur”. A experiência leva-o a realizar um documentário
que seduz o British Film Institute, que lhe vai permitir financiar a sua
primeira longa-metragem, “Angel”, adaptada de um dos seus romances. Em 1984
Jordan ganha prestígio e sucesso com “The Company of Wolves”, uma fábula sobre
a adolescência e a mitologia da sexualidade. Seguem-se vários outros grandes
sucessos: “Mona Lisa” (1986), “Jogo de Lágrimas” (1992), “Michael Collins”
(1996) ou “O Fim da Aventura” (1999), Casado com Vivienne Shields (dois filhos,
divorciado) e depois com Brenda Rawn (desde 2004, dois filhos). E conhecida uma
relação breve com Mary Donohoe, de quem tem também um filho.
Várias
nomeações para o Oscars. Ganhou em 1992 com o argumento de “The Crying Game”.
BAFTA
para Melhor Filme, Melhor Realizador e Melhor argumento para “The Crying Game”,
o mesmo acontecendo em 1999, com “The End of the Affair”. Muitos outros
prémiosnuma carreira altamente prestigiada.
Filmografia:
Como realizador: 1982: Angel (O Anjo da
Vingança); 1984: The Company of Wolves (A Companhia dos Lobos); 1986: Mona Lisa
(Mona Lisa); 1988: High Spirits (Malucos e Libertinos); 1989: We're No Angels
(Ninguém É Santo); 1990: Red Hot and Blue (TV) (episódios "Miss Otis
Regrets" e "Just One of Those Things"); 1991: The Miracle (Amar
Uma Desconhecida); 1992: The Crying Game (Jogo de Lágrimas); 1994: Interview
with the Vampire: The Vampire Chronicles (Entrevista Com o Vampiro); 1996:
Michael Collins (Michael Collins); 1997: The Butcher Boy (O Rapaz do Talho);
1999: In Dreams; 1999: The End of the Affair (O Fim da Aventura); 2000: Not I
(curta-metragem); 2002: The Good Thief (O Bom Ladrão); 2005: Breakfast on Pluto
(Breakfast on Pluto); 2007: The Brave One (A Estranha em Mim); 2009: Ondine;
2011-2013: The Borgias (Os Bórgias).
RALPH FIENNES (1962 - )
Ralph
Nathaniel Twisleton-Wykeham-Fiennes nasceu a 22 de Dezembro de 1962, em
Suffolk, Inglaterra, filho de Jennifer Anne Mary Alleyne, uma romancista, e de
Mark Fiennes, fotógrafo. Cresceu no seio de uma família aristocrática inglesa.
Tem seis irmãos, quatro dos quais dedicados à arte: Martha Fiennes,
realizadora; Magnus Fiennes, músico; Sophie, realizadora e produtora; Joseph
Fiennes, actor. Os dos restantes, um é arqueólogo, Michael Emery, o outro
biólogo e conservacionista, Jacob Fiennes. Ralph é ainda primo em 8º grau de
Carlos, príncipe de Gales, e primo em 3º grau do aventureiro Ranulph Fiennes.
Actor e realizador, Ralph Fiennes interpretou um conjunto importantes de obras,
onde deixou bem vincado o seu talento: “Schindler's List”, “The English
Patient”, “The End of the Affair”, “Red Dragon”, cinco “Harry Potters”, “The
Constant Gardener”, “The Reader” ou “Skyfall”. Recebeu diversas recompensas:
nomeado para Oscar em “Schindler's List” e “The English Patient”, indicado para
o Globo de Ouro de Melhor Actor em “Schindler's List”, “The English Patient”,
“The Duchess” ou “Bernard and Doris”, ganhou o BAFTA em “Schindler's List” e
foi ainda nomeado em “The English Patient”, “The End of the Affair” e “The
Constant Gardener”. A sua estreia como argumentista, realizador e produtor, com
“Coriolano” mereceu-lhe ainda um BAFTA especial como melhor estreia nesta
tripla função. Casado com a actriz Alex Kingston (1993 – 1997), a que se seguiu
um relacionamento com a actriz Francesca
Annis (1995-2006).
Filmografia
Como actor: 1990: Great Performances: A
Dangerous Man: Lawrence After Arabia, de Christopher Menaul (TV); 1991: Prime
Suspect, de Christopher Menaul (TV); 1992: Wuthering Heights (O Monte dos
Vendavais), de Peter Kosminsky; 1993: Screen Two: The Cormorant, de Peter
Markham (TV); The Baby of Mâcon (O Bebé de Macon), de Peter Greenaway;
Schindler's List (A Lista de Schindler), de Steven Spielberg; 1994: Quiz Show
(Quiz Show), de Robert Redford; 1995: Strange Days (Estranhos Prazeres), de
Kathryn Bigelow; 1996: The English Patient (O Paciente Inglês), de Anthony
Minghella; The Great War and the Shaping of the 20th Century (TV); 1997: Oscar
and Lucinda (Oscar e Lucinda), de Gillian Armstrong; 1998: The Avengers (Os
Vingadores), de Jeremiah S. Chechik; The Prince of Egypt (O Príncipe do
Egipto), de Brenda Chapman, Steve Hickner e Simon Wells (voz); 1999: Sunshine
(Sunshine), de István Szabó; Onegin (Onegin), de Martha Fiennes; The End of the
Affair (O Fim da Aventura), de Neil Jordan; 2000: How Proust Can Change Your
Life, de Peter Bevan (TV); 2000: The Miracle Maker, de Derek W. Hayes e Stanislav
Sokolov (TV) (voz); How Proust Can Change Your Life (TV); 2002: Spider
(Spider), de David Cronenberg; 2002: The Good Thief (O Bom Ladrão), de Neil
Jordan; 2002: Red Dragon (Dragão Vermelho), de Brett Ratner; 2002: Maid in
Manhattan (Encontro em Manhattan), de Wayne Wang; 2003: Freedom: A History Of
Us, de Philip Kunhardt Jr. (TV); 2004: The Chumscrubber (Os Amigos de Dean), de
Arie Posin; Ten Days to D-Day (TV); 2005: Chromophobia (Cromofobia), de Martha
Fiennes; 2005: The Constant Gardener (O Fiel Jardineiro), de Fernando
Meirelles; The Curse of the Were-Rabbit (Wallace & Gromit: A Maldição do
Coelhomem), de Steve Box e Nick Park (voz); Harry Potter and the Goblet of Fire
(Harry Potter e o Cálice de Fogo), de Mike Newell; Land of the Blind), de Robert
Edwards; 2006: The White Countess (A Condessa Russa), de James Ivory; Land of
the Blind (Terra de Cegos), de Robert Edwards; 2007: Bernard and Doris, de Bob
Balaban (TV); Harry Potter and the Order of the Phoenix (Harry Potter e a Ordem
da Fénix), de David Yates; 2008: In Bruges (Em Bruges), de Martin McDonagh; The
Duchess (A Duquesa), de Saul Dibb; The Reader (O Leitor), de Stephen Daldry;
The Hurt Locker (Estado de Guerra), de Kathryn Bigelow; 2010: Nanny McPhee and
the Big Bang (Nanny McPhee e o Toque de Magia), de Susanna White; Clash of the
Titans), de Louis Leterrier; Cemetery Junction, de Ricky Gervais e Stephen
Merchant; Harry Potter and the Deathly Hallows (Harry Potter e os Talismãs da
Morte: Parte 1) de David Yates; Harry Potter and the Forbidden Journey, de
Thierry Coup (curta-metragem); 2011: Harry Potter and the Deathly Hallows
(Harry Potter e os Talismãs da Morte: Parte 2), de David Yates; Page Eight, de
David Hare (TV); 2011-2014: Rev. (TV); 2012: Coriolanus (Coriolano) de Ralph
Fiennes; Wrath of the Titans (Fúria de Titãs), de Jonathan Liebesman; (Grandes
Esperanças), de Mike Newell; Skyfall (Skyfall), de Sam Mendes; 2013: The
Invisible Woman, de Ralph Fiennes; National Theatre Live (TV); 2014: The Grand
Budapest Hotel (Grand Budapest Hotel), de Wes Anderson; Mesyats v derevne (em
rodagem); Salting the Battlefield, de David Hare (TV); Turks & Caicos, de
David Hare (TV); 2015: James Bond 24, de Sam Mendes (em rodagem); A Bigger
Splash de Luca Guadagnino (em rodagem); Hail, Caesar! (em rodagem); 2016 Flying
Horse (em preparação);
Como realizador: 2012: Coriolanus (Coriolano);
2014: The Invisible Woman.
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